domingo, 22 de junho de 2014

Por inteiro


Por inteiro

"Ninguém se torna iluminado imaginando figuras de luz...mas sim, tornando a escuridão consciente"

C. G. Jung
 
  
 O que nos faz ficarmos com olhos fixos numa tela vendo homens correndo atrás de uma bola? No futebol encontramos um magnetismo: Dois times que se confrontam como num duelo, só que o objetivo é fazer mais gols ao invés de matar o oponente. O esporte tem sido uma ótima canalização dessa energia masculina, a força, a competição, a agressividade, o Yang como dizem os chineses, por um motivo de entretenimento e não de destruição.

Se pararmos para pensar, por que isso nos atrai tanto? Bom, para uns mais e outros menos, é verdade. Um campo com dois times podem simbolizar um conflito interno em uma pessoa. Já parou para perceber? Quando existe um conflito interno mais parece que tem uma batalha com dois times duelando. Polaridades que se extremam e se tornam opostas, unilaterais, como o frio e o quente, criando uma tensão devido a esta separação. E esse é o nível de consciência que temos manifestado: a da separação, da luta, do ganha-perde.

Para os orientais, um polo não pode existir sem o outro, o princípio feminino ou Yin e o princípio masculino ou Yang, os dois juntos fazem o princípio da criação. E só há uma forma de sair de uma condição polarizada de opostos a uma integração complementar: pela função transcendente que conecta os opostos, que vincula dados conscientes com inconscientes. Transcendendo opostos chegamos numa totalidade de nosso Ser inteiro.

Quem está manifestando apenas um lado de seu ser, apenas sua generosidade, por exemplo, sua mesquinhez encontra-se  escondida e uma hora aparece. Geralmente pessoas que se mostram sempre boazinhas, uma hora podem se mostrar terríveis. Tudo que fora escondido na psique uma hora volta com a força de uma água que fora represada que finalmente consegue voltar a fluir.

Aquilo que você se nega e não quer ver em você mesmo acaba indo para a sombra. Esta por sinal é muito mais fácil de ser vista no outro como projeção. Tudo precisa ser encarado e aceito, projeções precisam ser recolhidas, pois é daí que vem a integração de uma pessoa saudável. A negação só divide, por isso precisamos olhar para todos os lados de nosso ser. Uma pessoa que encara sua inveja, sua competição, seu ciúmes, enfim, seu lado sombrio, consegue ser muito mais íntegra justamente por ter sua sombra a seu alcance e por isso com condições de dominá-la e não ser dominada por ela.

Há pessoas que dizem não ter ciúmes, medo ou não sentirem inveja, desejo de poder ou vingança. Essas pessoas se não forem iluminadas, são bastante inconscientes de sua condição humana. É melhor deixar o orgulho de lado e encararem seu lado sombrio para despotencializá-los, do que criarem um fantasma que pode atacá-lo devido sua inconsciência.

Uma sombra coletiva que temos vivenciado é o da falta de ética, corrupção, abuso de poder, falsa democracia, falta de transparência. E é somente cada um olhando para isso que vai poder tirar a força dessa sombra, trazendo-a para a luz da consciência. E é também olhando cada um para seu interior e vendo onde está o desequilíbrio e a desigualdade dentro de si mesmo que se faz manifestar no Todo.  O mais fácil é culpar os outros, os mandantes e eles são sim os líderes, mas não somente eles podem ter a total responsabilidade, pois se eles estão em papel de tirano é porque o povo entrou no papel de vítima, criando este tirano e essa separação.

O povo brasileiro está em parte mais acordado sim, mas ainda cai nas ilusões, manipulações e benefícios imediatistas.  Manifestações são hoje vistas pelo mundo todo e apoiadas. A cidadania precisa ser vivida e respeitada por ambos os lados, em seus direitos e deveres até que não haja mais lados e sim um só e os líderes possam realmente representar seu povo e caminharem juntos.

O ganha-perde na vida real é um jogo sem evolução. Que possamos transcender para um ganha-ganha da justiça e igualdade sociais. Que possamos iluminar aonde precisa ser olhado e vibrar por vitórias de real conquista. Que toda luta não seja em vão! Queremos nossos direitos, como no hino cantado nos jogos com tanto amor e alma, por inteiro e não pela metade.

Sílvia Rocha – Psicóloga – silviaayani@gmail.com

www.silviarenatarocha.blogspot.com.br

 

 

quinta-feira, 12 de junho de 2014

E por falar em paixão... E por falar em amor...


E por falar em paixão...  E por falar em amor...

Paixão não se discute, porque não é da ordem do intelecto. Estar apaixonado é entrar num campo irracional, quase místico, da esfera do encantamento. Não se explica, ela arrebata, chega invadindo. A paixão move, mobiliza, faz querer ser melhor, faz querer lutar pelo objeto amado. É se sentir atraído e não conseguir tirar o olho, é ter taquicardia e achar bom. Eu posso estar falando de paixão por futebol, por música, por religião, por poesia, por animais, por política, ou pelo seu amado ou amada.

A Paixão é de extremos, num momento se conhece o céu e no outro o inferno, pois a  felicidade fica condicionada ao movimento do objeto amado. Se o meu time perde, fico arrasado, como se fosse eu que tivesse fracassado. Se meu time ganha, sinto-me vitorioso. No caso de relacionamento, se o outro corresponde, serei feliz, se o outro não vier, ai de mim.

Diz-se que paixão tem a mesma raiz de patologia, e que é uma doença. Talvez a doença seja a do não ver, pois a Paixão está cheia de projeção, que quer dizer - aquilo que não vejo em mim, vejo em você.  Na idolatria, há uma exaltação do outro, tão apaixonada, como se o outro fosse um deus e não humano, como se o outro fosse mais do que eu. Então, estar perto dessa pessoa pode virar uma saia justa, um martírio, pois posso querer tentar ser diferente, me moldar a ela, posso sentir que nunca estarei em seu patamar, sentindo-me constrangido e inferior.

Paixão vem do latim, passionis que significa “sofrimento”. Por que será? A ilusão da perfeição cai sobre uma pessoa, a projeção de um ideal é colocada em alguém. E se um dia essa pessoa não se encaixa mais nessa projeção, ocorre a decepção, o sofrimento. Paixão e ilusão caminham de mãos dadas. Tem algo de inconsciente nas duas. Na paixão faço uma imagem do outro sem que eu realmente o conheça. O encantamento é com a imagem que eu faço do outro e não com o outro como ele realmente é. Então, a desilusão é muito bem vinda, para se entrar na realidade. Apesar da dor que isso pode significar, cair na real ainda é mais saudável do que se manter iludido.

A imagem projetada normalmente é algo que julgo faltar em mim ou pelo menos não consigo acessar dentro de mim. Então busco fora, no outro e ainda espero que o outro venha me completar. Essa falta de inteireza vem da falta de auto-conhecimento. A ânsia por um companheiro é legítima, por alguém que compartilhe a vida, testemunhe histórias, partilhe alegrias, apoie nas tristezas; a ânsia por tapar um buraco, por aliviar a carência, por me salvar de algo, não é.

A solidão pode ser boa quando estamos plenos de amor e alegria. E quando se torna transbordante, temos para dar. É me amando que consigo amar. É me enxergando que consigo enxergar, daí fica mais difícil criar ilusões, projetar o tempo todo. Se a paixão é cega, o amor faz ver que o outro é simplesmente um outro humano, com o pacote completo do que é ser humano: Virtudes, falhas, dúvidas, medos, alegrias, incongruências, inteligência, humildade, arrogância,  altos e baixos, rigidez ou flexibilidade, força e vulnerabilidade. E se o amor permanece com esse conhecimento do outro, é amor mesmo.

Se a paixão mascara, o amor expõe, sem medo de não ser aceito. Não existe felicidade maior do que concordar com aquilo que é. Há um relaxamento nisso, uma paz da segurança. O que não significa falta de atenção. Se a zona de conforto fizer com que  a relação se paralize, a relação pode morrer. Para que haja estabilidade também é preciso de renovação, o que doses da boa paixão, aquela tensão criativa, podem proporcionar: a surpresa, o sair da rotina, viajar, curtir as diferenças, encantar-se com sutilezas, celebrar momentos e vitórias.

A admiração pode dar um tom mais maduro ao enamoramento, esse amor que vem com o tempo, com respeito à individualidade e que só tende a crescer, se um oferece espaço e apoio para que o outro se realize. E ambos se realizem juntos com projetos em comum.

Feliz dia dos namorados!

Sílvia Rocha – silviaayani@gmail.com

www.silviarenatarocha.blogspot.com.br

sábado, 7 de junho de 2014

Meio Ambiente Inteiro


Meio Ambiente Inteiro

Dia 05 de junho é o dia Mundial do Meio Ambiente. Este dia comemorativo foi criado em 1972 por uma conferência da ONU que reuniu mais de 100 países com o objetivo de catalizar a atenção e promover eventos mobilizadores de consciência e ações em prol do meio ambiente. De lá para cá passaram-se 42 anos, será que a consciência se expandiu ou a devastação aumentou? 

Enquanto os seres humanos perceberem o meio ambiente como algo que está fora não será possível uma consciência plena. Buscando significado para meio ambiente na internet encontrei definições que podemos resumir em “local onde a vida se desenvolve”. Na Wikipédia, “O meio ambiente, habitualmente chamado apenas de ambiente, envolve todas as coisas vivas e não-vivas que ocorrem na Terra, ou nalguma região dela, que afetam os ecossistemas e a vida dos seres humanos.” 

“Afeta a vida dos seres humanos”? Ou será que os seres humanos afetam a vida do planeta? Ou ambos se afetam e interagem mutuamente?

Por estas definições percebemos uma separação entre seres humanos e natureza. E cada vez mais nos grandes centros urbanos o homem vai se afastando, trabalhando em escritórios-cubículos, apartamentos-gaiola, concretos, vidros, aço e eletricidade.  

Não sei porque a maioria das casas onde morei, as ruas são de paralelepípedo, onde mato pode crescer rebeldemente entre uma pedra e outra. O asfalto me dá uma sensação de excesso de civilidade, que para mim pode significar falta de saúde. Gosto de ver aquele verdinho por entre o cinza, me dá a sensação de que nem tudo fora ainda dominado.

Como diz Clarissa Pinkola Estes, autora junguiana, “Não é por acaso que as regiões agrestes e ainda intocadas do nosso planeta desaparecem à medida que fenece a compreensão da nossa própria natureza selvagem mais íntima.”

Acostumamos a ver o mundo com olhos da mente fria e racional, que nos distancia do que é observado. Assim a natureza se torna um ente separado, um objeto de estudo e de laboratório, uma coisa que está a mercê e à serviço do homem que tenta controlá-la ao máximo. O utilitarismo é fruto desta visão cindida e racional. Então quando eu olho o mundo, a natureza, os animais com essa visão, eu penso de que forma eles me podem ser úteis.

 Um ser inteiro em sua totalidade é muito mais do que pensamento. É também sensação, sentimento, intuição. Uma outra concepção de mundo, seria ao invés de apenas ver a natureza, também ouvi-la ou senti-la como fazem os indígenas. Segundo Leonardo Boff nos conta, a cultura andina percebe o mundo numa teia de relações vivas, carregadas de sentido e mensagens. Se escutarmos o vento, os rios, as montanhas, a Terra, talvez pudéssemos aprender a cuidar mais da vida. Ele ainda ressalta: “Só dominamos a natureza, obedecendo-a, quer dizer, escutando o que ela nos quer ensinar. A surdez nos dará amargas lições.” E tem nos dado.

De que forma podemos cuidar de nossa própria natureza para que possamos realmente cuidar da Mãe natureza? Uma das grandes preocupações ecológicas é o lixo. Para onde ele vai, se vai contaminar, explodir, entulhar, causar doenças? E nosso lixo interno? Estamos reprimindo, entulhando, contaminando relações, causando doenças? Pensando nessa questão relacionei os “3 Rs” do  gerenciamento de resíduos sólidos ao nosso auto-gerenciamento.

Reduzir descartáveis – De que forma podemos reduzir gastos de energia?  A maioria das coisas que nos preocupamos nunca aconteceu e nem acontecerá, por exemplo. Relacionamentos são descartados ou trocados como uma máquina com defeito. Pessoas também têm sido usadas. Se o vínculo for pelo sentimento, há mais chances de um encontro verdadeiro.

Reutilizar produtos usados dando a eles outras funções – Experiências que não foram exatamente como esperávamos, podem servir de preparação para novas oportunidades, lições de vida que levam à sabedoria.

Reciclar produtos transformando usados em algo novo – transformar expressões de emoções, ao sentir raiva, por exemplo, ao invés de agredir alguém com palavras ou atitudes, usar essa força para fazer algo pró-ativo. A tristeza em meditação, o medo em cuidado.

Feita nossa ecologia interna, transbordaremos para o externo naturalmente. Enquanto estivermos usando sacos plásticos que entopem bueiros e engasgam seres do mar, entulhando o planeta, enquanto nossos lixos internos e externos estiverem na sombra, não estaremos inteiros na busca da saúde do nosso meio de vida. O comprar compulsivo para tapar vazios existenciais, precisa ser banido. Podemos nos preencher de natureza, somos natureza! Meditar ampliando percepções, pode ser uma boa prática para quem quer alçar vôos ainda maiores rumo à Totalidade.

Sílvia Rocha – silviaayani@gmail.com

WWW.silvia.renata.rocha.blogspot.com.br