Arquétipo do
Visionário
“Se você não dá
expressão às suas próprias idéias,
se não dá ouvidos a
seu próprio ser, você trai a si mesmo.” Rollo May
Em
março deste ano escrevi sobre o arquétipo do guerreiro, presente em todas as
culturas, segundo a antropóloga Angeles Ariens. Arquétipos são estruturas
inconscientes existentes na psique coletiva da humanidade. Ariens em sua
pesquisa transcultural consegue traçar paralelos, enxergar a interface de
aspectos que permeiam os primeiros povos de todo planeta e nossa civilização
ocidental. Nessa enxurrada de informações, opiniões e notícias que nos assaltam
todos os dias, não podemos esquecer de que existe algo que vem de dentro, algo
que sabe e algo que vê, uma parte nossa que intui, é instintiva e que pode ter
sido ocultada pelos excessos que cometemos.
No
caminho quádruplo, Ariens torna acessível a sabedoria dos povos nativos vinda
de um contato maior com a natureza e seus ciclos, contato esse que também temos,
mas que encobrimos devido a nosso estilo de vida urbano. Além do guerreiro, os
arquétipos do visionário, curador e mestre são presentes em nós, adormecidos ou
não. Nossos instintos nos ajudam a viver, trazem a força necessária à
sobrevivência. Viver apenas no intelecto ou na emoção não trazem a ação para
a conquista de seu próprio espaço de
realização na vida.
Pelo
caminho do Visionário é possível expressar a criatividade trazendo ao mundo uma
visão pessoal. Segundo os nativos cada pessoa possui um sagrado ponto de vista.
Todos são valorizados desde a criança até os mais velhos. A criança traz a
pureza e autenticidade das emoções e os mais velhos a experiência de vida, a
sabedoria. Homens e mulheres, jovens e adultos, todos tem suas visões e ideais
e quando expressos formam uma visão coletiva da comunidade.
Numa
organização, faz parte do planejamento estratégico encontrar a missão, a visão
e os valores que guiarão as pessoas que trabalham nela, balizando
comportamentos esperados e condutas almejadas para um fim comum. Missão é aonde
a organização quer chegar, um ponto futuro para a qual é desejado que todos
dirijam seus esforços. Visão é o que ela vai estar fazendo quando chegar lá e
os valores regem o como chegarão lá. Cada pessoa tem sua missão na vida, que
precisa descobrir e pode construir uma visão do que seria alcançá-la e de que
forma.
O
arquétipo do visionário inspira o sonho ou propósito de vida e a seguir
firmemente no caminho da verdade que a autenticidade dos sonhos pedem. Os xamãs
toltecas nos contam que as pessoas deveriam seguir quatro compromissos para
trilhar um caminho digno, honrado e feliz na vida. Um deles é a impecabilidade
com a palavra, dizer sempre a verdade ou aquilo que acredita que é certo. É
claro que esta comunicação íntegra precisa avaliar o momento, o contexto e se o
receptor está apto a ouvir. Os outros compromisso são: Não leve nada para o
pessoal, não tire conclusões e dê sempre o melhor de si. Segundo Don Miguel
Ruiz esses compromissos o levam a libertar da ilusão e ser fiel a sua própria
verdade.
Muitas
pessoas não fazem contato com seus sonhos ou o colocam nas mãos de outros. Não
se dão conta que valores ou compromissos regem suas vidas e muito menos por
qual visão estão lutando.
O
que ocorre muitas vezes é uma neblina encobrindo a visão, são padrões de
negação e indulgência. Quando vemos as coisas como queremos ver e não como elas
realmente são. A sombra do Visionário é a abnegação, que se trata da renúncia a
si mesmo por medo de perder o amor de alguém: “Se eu expressar o que eu vejo
ele não vai mais gostar de mim”. Para obter aceitação e aprovação: “é melhor
fingir ser outra pessoa”. Para manter a paz e o equilíbrio: “Melhor me calar
diante das dificuldades.”
Dizer
a verdade sem críticas ou julgamentos, destrói padrões de negação, trazendo o
confronto com a situação real e saindo da ilusão. A verdade às vezes pode doer,
mas cria uma ponte de confiança e uma aproximação com o outro. Ter a coragem de
ser quem somos é caminhar em direção oposta à abnegação. Para isto é importante
observar se meu senso de auto-valorização está maior do que minha auto-crítica.
Para
acessar o visionário, sonhar e perceber sua própria verdade podemos lançar mão
de alguns meios como: meditar, rezar, contemplar. Ninguém encontra o seu ser mais
profundo com uma mente cheia de burburinhos. Respeitamos o visionário que há em
nós quando damos voz ao que vemos, sentimos, sonhamos.
Alguns
xamãs fazem uma busca de visão no alto da montanha, onde passam dias sem comer e
nem beber até que uma visão de vida apareça.
Uma introspecção profunda é acompanhada de uma revelação. Ás vezes ela
vem quando estamos distraídos brincando saudavelmente. A autenticidade e
espontaneidade aparecem quando estamos mais relaxados do que quando ansiamos
por algo. Para isso basta observar uma criança, nossos pequenos mestres
visionários.
Sílvia Rocha
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