quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Por todas as nossas relações


Por todas as nossas relações

“Todos os seres do universo são inter-retro-conectados, formando a comunidade cósmica. Os seres vivos são todos parentes entre si, pois todos – da bactéria originária aos seres humanos – possuem, fundamentalmente, o mesmo código genético. Isso nós o sabemos hoje por causa da ciência.

Os povos originários, nossos indígenas, o sabiam muito antes da ciência. Sabiam pela intuição e pelo coração, que os colocam em íntima comunhão com tudo o que existe no universo.

Eles sempre mativeram o casamento entre o Céu e a Terra, do qual nascem todas as coisas.”

Leonardo Boff

                Aho Mitakuye Oyasin é uma expressão do povo nativo Lakota dos Estados Unidos, que significa “por todas as nossas relações”. Aponta para uma consciência de interconexão com toda a criação: "estamos todos ligados". Uma oração de unidade e harmonia com todas as formas de vida. Consideram o sol como avô, a lua como avó, a Terra é mãe e o céu é o pai. Assim todas as formas de vida são nossos parentes. Ancestrais não são somente os parentes que vieram antes, mas toda vida na Terra que coopera para que eu esteja aqui. O sol aquece a Terra e nos dá a vida, os pássaros ajudam a fertilizar a terra, a chuva é essencial para a existência da floresta, as árvores com suas raízes ajudam a fixar o solo que nos dá os frutos, e assim por diante.

                Em termos científicos, o pensamento sistêmico, segundo Fritjof Capra, “alude ao pensamento em termos de relacionamentos, padrões e contextos”. O padrão básico de organização de todo e qualquer sistema vivente é em formato “rede”. Ecossistemas são verdadeiras teias de alimento e redes de organismos; organismos são redes de células; e células são redes de moléculas. Rede é um padrão comum a todo tipo de vida. Onde quer que nos deparemos com vida, constataremos redes. E numa rede, se um ponto sofre alguma modificação vai influenciar todo o resto do sistema.

                Como na teoria do caos, de Lorenz e sua famosa frase: “O bater das asas de uma borboleta no Brasil pode causar um tornado no Texas”, essa teoria traz explicações de fenômenos não previsíveis. Portanto, a Teoria do Caos é um padrão de organização dentro de um fenômeno desorganizado, ou seja, dentro de uma aparente casualidade.

Uma vez ouvi uma história que ilustra bem o que falamos: “Um casal teve uma discussão em casa e o marido sai para trabalhar, pega seu carro e no sinal vermelho, um menino vem vender balas, ao que o homem já estressado, se assusta e empurra o garoto, que cai perdendo todas as balas que se espalham e são amassadas pelos carros já em movimento.  Mais tarde o garoto é surrado pelo pai e quase morre, por não ter trazido dinheiro para casa. No dia seguinte o marido lê no jornal a notícia do pai que quase mata o filho e comenta com sua esposa: “nossa como o mundo está violento!” Li, desta vez na internet, uma outra história mais otimista dessas interconexões: “Uma senhora dirigia seu carro pela estrada com uma forte tempestade e seu pneu fura. Um carro pára na sua frente e um jovem se oferece para trocar seu pneu. A senhora oferece dinheiro ao rapaz que nega e diz somente para fazer o bem para a próxima pessoa que vir. Então a senhora pára numa lanchonete já tarde da noite e uma garçonete grávida de seus 8 meses a serve. Ao recolher a louça deixada pela senhora ao sair, a garçonete se surpreende com uma alta gorjeta deixada pela senhora. Em casa, comenta com o marido que a gorjeta veio em boa hora para ajudar com a chegada do nenen e pergunta a ele como foi seu dia. Ele responde que ajudou uma senhora na estrada a trocar o pneu de seu carro.”

Conexões ocultas, são esses fios invisíveis que ligam acontecimentos, destinos, encontros, a influência de ações. Um simples sorriso pode modificar o dia de alguém, perder um avião ou ônibus pode fazer você conhecer outras pessoas que irão influenciar sua vida. O deixar cair de uma ponta de cigarro na floresta pode causar um incêndio de sete dias causando o sofrimento de animais, alteração climática e danos para a saúde da população.

Estar atento ou desperto a essas conexões, é algo que os indígenas fazem por saberem que estão dentro desta teia que é a vida. O que isso pode nos proporcionar? Um nativo das Philipinas observando o movimento dos animais, percebeu a vinda do tsunami e tentou em vão avisar a população. Sua tribo se protegeu em locais mais altos. Mas muitos desavisados, não.

O pensamento complexo de inter-relacionamento e interdependência nos faz reavaliar todo nosso modos vivendi, a sair da ilusão de separação. Convida-nos a sair da individualidade, para uma proposta de vida mais cooperativa, humana e a favor da vida. Na filosofia Ubuntu, do povo nativo da África do Sul, “eu sou quem eu sou porque nós somos” e “como ser feliz se o outro está triste?” Essas filosofias sistêmicas trocam o pensamento competitivo, corrupto, consumista do ganha-perde para a cooperação e confiança do ganha-ganha. Minhas ações no mundo acabam voltando para mim neste círculo da vida.

Aho!

Sílvia Rocha – Psicóloga Transpessoal Junguiana, consteladora familiar sistêmica e arteterapeuta.


 

 

 

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