Vínculos Invisíveis
“Enquanto
trabalhava em minha árvore genealógica, compreendi a estranha comunhão de
destinos que me ligava aos meus antepassados. Tenho a forte impressão de estar
sob a influência de coisas e problemas que foram deixados incompletos e sem
resposta por parte de meus pais, meus avós e outros antepassados.” C. G. Jung
Um
casal já havia se casado há anos, mas não moravam juntos. O homem só arrumava
trabalho em outro estado, o que o tirava de sua convivência familiar. Sempre
que era questionado sobre procurar um trabalho na mesma cidade que sua mulher,
este dizia que não existia e que não adiantava procurar. Aconteceu na infância
desse homem, uma doença na família. Seu pai teve uma tuberculose grave
fazendo-o ficar internado e sem possibilidade de contato com sua mulher e
filhos sob risco de contágios.
Uma
mulher talentosa por mais que trabalhasse, não conseguia ver a cor do dinheiro.
Se estivesse próxima ao sucesso arrumava um jeito de se boicotar e perdia tudo
que conquistara. Num exame de sua ancestralidade contou que duas avós haviam
sido escravizadas, com perda de sua liberdade, sem receber qualquer remuneração
ou reconhecimento por seu trabalho.
Um
homem com dificuldades de falar em público, perdeu seu avô que era militar,
quando este ensinava seus alunos a desarmar uma bomba. Teve seu pescoço
destroçado.
Uma
moça que não conseguia se aproximar de sua filha que morava com o pai, em sua
infância passou anos morando em outro estado na casa dos avós, longe de sua mãe
devido a problemas financeiros de sua mãe.
Um
rapaz que sempre se metia em confusão e brigas, sentia-se indignado com desejos
de vingança e sem saber o porquê, teve em sua ancestralidade, parentes mortos
em campos de concentração nazista.
Uma
mulher que queria se casar, mas não conseguia, levantou em sua pesquisa
biográfica 3 tias que morreram solteiras.
Vínculos
invisíveis são exemplificados nessas historias acima. Comportamentos e até sentimentos que se
repetem inconscientemente como forma de lealdade ao sistema familiar a que
pertence. Assuntos pendentes, questões que não foram resolvidas, pessoas que
foram excluídas ou não foram homenageadas ou honradas devidamente acabam
influenciando as gerações seguintes.
Os
povos nativos já sabiam disso e acrescentam que sete gerações antecessoras nos
influenciam e nós iremos influenciar sete seguintes. O biólogo inglês Rupert
Sheldrake, estudou esse campo dotado de saber e o nomeou campos mórficos. Trata-se de uma totalidade abrangente, um campo
perceptual disponível, mas muitas vezes inconsciente. “Toda estrutura, seja uma
organização, um organismo ou um sistema vive num campo mórfico que atua como
uma memória onde estão armazenadas todas as informações importantes do sistema.
Portanto, todos os elementos individuais como partes do todo estão em
ressonância com o todo. Cada parte dessa estrutura, portanto, cada membro desse
sistema ou cada indivíduo de uma organização participa do conhecimento sobre o
todo e de todos os acontecimentos importantes. Nesse sentido, a memória não é
observada como uma função ou uma conquista pessoal de nosso cérebro, mas como
um “campo de memória”, no qual nos movimentamos como um rádio, no meio das
ondas radiofônicas. (FRANKE)
Sheldrake
diz que é mais fácil perceber a existência desse campo, quando sentimos que
alguém está nos olhando por trás e então nos viramos para olhar na mesma hora.
Estamos mergulhados em campos de energia que se comunicam através de
ressonância, a que ele chamou de ressonância mórfica, assim informações podem
ser veiculadas entre campos para além do espaço e do tempo como ondas de um
celular.
Na terapia familiar sistêmica, pode-se
acessar esses campos através de técnicas terapêuticas como a constelação
familiar sistêmica criada pelo alemão Bert Hellinger. Num trabalho de grupo
colocam-se pessoas para representar os parentes do cliente. “É surpreendente
como os representantes conectam-se com este campo de força trazendo o
conhecimento e a realidade da família sem nem ao menos terem algum conhecimento
prévio da família. Alguns representantes chegam a sentir sintomas físicos da
pessoa que está representando.” (Hellinger)
Quando
esses vínculos invisíveis tornam-se claros, é possível transformar a homenagem
inconsciente feita através da repetição de padrão comportamental em homenagem
mais consciente, sendo assim desnecessário continuar com aquele comportamento,
libertando e possibilitando novas escolhas de vida. É interessante como pessoas
que possuem valores éticos acabam por serem impelidas a cometerem ações contra
esses valores, movidas por uma carga energética de seus antepassados. Hellinger
costuma falar que “em família de ladrão, quem não rouba se sente culpado”. E
para se sentir pertencendo ao sistema familiar precisa repetí-lo. Outras
pessoas acabam por trair seus parceiros para homenagear ancestrais que fizeram
o mesmo. É muito forte o magnetismo do
campo familiar. Nas culturas nativas e também na cultura oriental é comum fazer
reverência e homenagens aos ancestrais. São deles que vem a força de vida.
Para
reestruturar um sistema que está com esses emaranhamentos e repetições,
Hellinger criou frases e gestos-rituais para poder a pessoa “se soltar” desses
vínculos invisíveis. Todas elas em síntese remetem à gratidão pela vida dada
pelos ancestrais e em gestos como se curvar com muito respeito e em homenagem.
Pequenos
gestos que promovem uma cura, uma reconciliação entre pessoas da família e
libertam descendentes de repetirem destinos difíceis. Reverenciar ancestrais
nos permite perceber que a vida vem de muito longe e o quanto ela é querida e
sagrada, merece ser bem vivida e se fazer algo de bom, enquanto estiver em
nossas mãos.
Sílvia Rocha –
Psicóloga Transpessoal Junguiana, crp:05/21756
Arteterapeuta
e consteladora familiar sistêmica
Contato: silviaayani@gmail.com
ncrível!!! Obrigada, Silvia! Este artigo está super claro, muito bem escrito. Além de tudo, o artigo tem bastante significado para mim e confirma algumas experiências que tenho vivido. Agora, fiquei ainda com mais vontade de fazer a constelação familiar! Grande beijo! Cinthia
ResponderExcluirQue bom Cínthia que gostou. Esse trabalho é incrível mesmo. Espero você, um beijo
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